L'Oréal: muito além
do batom |
Fonte: Ruth de Aquino, de Paris/ Veja "Lábios
europeus e brasileiros precisam de fórmulas diferentes
de batom para alcançar o mesmo efeito." A afirmação
é de Lindsay Owen-Jones, o galês de 56 anos que
comanda desde 1988 a L'Oréal, a maior fabricante mundial
de cosméticos. Essa gigante com sede na França
abriga marcas populares e de luxo, como Lancôme, Helena
Rubinstein, Vichy, Biotherm, a brasileira Colorama e tantas
outras. Há dezessete anos consecutivos apresenta lucros
líquidos de mais de 10%. Mesmo em tempos bicudos, o
lucro aumentou 19,6% em 2001. Na metade de 2002, os números
apontavam para um crescimento de 29%. Nos últimos quinze
anos, as vendas triplicaram, o lucro líquido aumentou
seis vezes e o valor da ação do grupo foi multiplicado
por 22.
Na Inglaterra, The Economist escolheu a L'Oréal como
a empresa de melhor desempenho na Europa em 2002. Owen-Jones,
por sua vez, foi o "Executivo do Ano", um prêmio
dado em novembro pela revista Le Nouvel Economiste, que ele
recebeu das mãos do primeiro-ministro francês,
Jean-Pierre Raffarin. Em junho foi eleito por um júri
de onze editores de publicações econômicas
européias como o "Melhor CEO da Europa".
"Nossa profissão é uma ciência, por isso investimos
tanto em pesquisa", diz OJ (ôu-djêi), como Owen-Jones é
conhecido dentro da empresa. Mais exatamente, a L'Oréal destina à
pesquisa mais de 3% do volume total de suas vendas. Não é pouco.
Em 2001, as vendas do grupo somaram 14 bilhões de dólares. Nos centros
de pesquisa científica e avaliação espalhados por três
continentes, foram gastos 450 milhões de dólares. Tudo para que
aquele pote de creme anti-rugas que fica na mesinha-de-cabeceira ou o creme de
hidratação e a tintura usados no cabeleireiro não decepcionem
a consumidora, seja no Brasil, no Japão, em Nova York ou, até mesmo,
na França. Porque, embora a L'Oréal continue sendo francesa, com
Owen-Jones o grupo realmente se globalizou. Hoje, 86% das vendas e 68% dos funcionários
estão fora da França.
Como o conceito de beleza varia de país para país,
e como a etnia e a cultura determinam o que é valorizado
na aparência, a L'Oréal vem correndo atrás
de todos os mercados em expansão, especialmente a Ásia
e a América Latina. No Brasil, onde mais de 60% das
mulheres têm cabelo ondulado em graus variados e o clima
e a água são totalmente diferentes dos da Europa,
o xampu precisa ser distinto. A mesma filosofia se aplica
a cremes e produtos de maquiagem. Às vezes, um ou outro
produto consegue aceitação no mundo inteiro.
Um exemplo é o Revitalift, um creme anti-rugas. Os
laboratórios de pele e cabelos da L'Oréal em
Paris, que estudam novas moléculas e buscam produtos
com novas propriedades, parecem um cenário de ficção
científica. Microscópios convivem com batedeiras
de cozinha e toda espécie de aparelhos. Na pequena
salle jaune (sala amarela), substâncias são manipuladas
dentro de uma espécie de aquário sem água
nem oxigênio. As amostras de pele são fornecidas
por hospitais gratuitamente, de biópsias e cirurgias.
Há um comércio formal e lucrativo que vende
cabelos.
"Para colocar um produto no mercado, podemos levar de quatro meses, se
for apenas removida uma fragrância, a dez anos, nos casos em que se descobrem
novas moléculas. A partir daí iniciamos uma série de pesquisas",
disse a VEJA Philippe Touzan, diretor do laboratório que pesquisa produtos
para a pele, no Centro de Chevilly, subúrbio de Paris. Philippe sabe que
mulher no Japão é diferente de mulher no Brasil. "As brasileiras
preferem cuidar do corpo; as orientais, do rosto", conta.
Segundo Isabelle Walter, do departamento de comunicação
internacional do grupo, "as coreanas chegam a usar vinte
produtos no rosto num só dia". Ela acrescenta
que, no ramo dos cosméticos, o controle de qualidade
é tudo. "A L'Oréal não tem o direito
de produzir algum efeito colateral nocivo", diz. "Não
é como remédio, que traz bula com advertências."
O desenvolvimento de tecnologia é, na grande maioria,
centralizado na França, mas a tendência de globalização
começa a se impor também na pesquisa. Um exemplo
é o xampu Hidra-Max. O marketing brasileiro da L'Oréal
detectou a necessidade de criar um xampu para os cabelos ondulados
das brasileiras e pediu à sede um produto específico.
Várias fórmulas foram desenvolvidas em Paris,
depois testadas em mulheres no Brasil, até se chegar
ao Hidra-Max, que emplacou tão bem que já está
sendo vendido também com sucesso no México,
no Chile e nos Estados Unidos. Neste ano será inaugurado
na cidade americana de Chicago um centro específico
para estudar o que chamam de "cabelo e pele étnicos"
- ou seja, cabelo e pele de negros. Os 2.743 pesquisadores
da L'Oréal são de trinta nacionalidades e podem
escolher entre 25 especializações profissionais.
Novo, melhor e diferente. Estas são as três obsessões
que norteiam as pesquisas de cosméticos, perfumes e produtos para cabelo.
A colaboração com universidades e empresas de informática
e a celebrada parceria, desde outubro, entre o departamento de pesquisa avançada
da L'Oréal e os Sistemas Dassault (motores, aviões, carros), tudo
isso tem contribuído para sofisticar e diversificar a oferta de produtos,
o que "enlouquece" mulheres de todos os continentes.
A L'Oréal já cultiva cabelo in vitro e consegue, na proveta,
um crescimento de 1,5 centímetro em 45 dias, o mesmo do cabelo normal.
Novas substâncias, como o silicone, adicionam mistérios a ser explorados.
Há sempre um novo extrato vegetal, um óleo desconhecido que pode
ser descoberto e utilizado. "Com as manipulações, transformamos
cremes em produtos translúcidos, quase líquidos. Na Coréia
existe um creme para remover maquiagem que, de tão bonito, dá vontade
de comer", diz Touzan. É ver para crer.
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